O PRÍNCIPE GATO




Bento  de Luca

Com lançamento previsto pelo Grupo Editorial Novo Século,  O Príncipe Gato, escrito por Bento de Luca, pseudônimo dos jovens autores e primos Marcelo Siqueira e Gustavo Costa, é uma trilogia de fantasia que promete conquistar leitores pelo Brasil. O primeiro da série, A Ampulheta do Tempo, lembrou-me muito as excelentes histórias de Philip Pullman, autor de A Bússola de Ouro, A Luneta Âmbar e A Faca Sutil, uma trilogia que me conquistou pelo estilo. Aqui será postado apenas uma trecho do livro que me deixou curioso como um gato. Entre no site: www.oprincipegato.com.br


I – Alucinação


 Príncipe Gato

Para os que pensam o contrário, não, não é fácil estar na minha situação! O fardo é grande. O tempo urge. Além do mais, ser um príncipe, ou ainda, um “escolhido”, não é algo tão extraordinário assim. Na minha terra, em Marshmallow, alguns dizem que se nasce príncipe; outros ainda preferem dizer que os anos é que formam um príncipe... Eu acho mais auspicioso dizer que se nasce príncipe. Ou você é, ou você não é. Simples assim. Mas até compreendo os outros pontos de vista, e não discordo em sua totalidade.
Meu nome? Sempre me chamam de Príncipe Gato. Gostaria que continuasse assim mesmo.
Digamos que minha chegada nesse mundo não foi das melhores. Uma viagem turbulenta. Vomitei um monte de peixes moídos assim que surgi do Buraco de Minhoca. O local do portal não tinha aparentemente nada de significativo. Era um plano elevado que logo despencava, culminando em grades verdes que limitavam o parque, levando para a rua.  Como uma pequena cerca, havia troncos enfiados na terra, demarcando a parte arbórea da calçada de pequenas pedras. Uma árvore se contorcia e abraçava outra mais velha ― se enroscando como enamorados. Precisei olhar bem o lugar, para que lembrasse depois — não poderia de jeito algum esquecer, caso contrário não teria como voltar para casa. Ou pelo menos achava que não.
Parque do Trianon, zona sul de São Paulo. Fiz desse lugar meu lar. Fiquei dias e noites analisando o ambiente. As criaturas de lá são um pouco estranhas; confesso que me assustei de início. Mas possuía meu cinto de utilidades, minha pistola de ácido, minhas bombas de farinha, minhas garras afiadas e ainda um bocado de coragem e responsabilidade na alma.
Aprendi bastante sobre o parque. Sabia a localização de todas as câmeras de segurança ― inclusive tinha desativado uma delas ― e os costumes dos vigias e dos policiais. Durante o dia era mais complicado, à noite é que podia andar mais tranquilo. Alguns gatos pareciam morar por lá, mas eram estranhos, andavam de quatro patas e não falavam ― realmente esquisitos. Até tentei puxar conversa com um deles no início, porém foi em vão. Mas aprendi a me comportar como eles, assim eu poderia passar desapercebido em alguns momentos, embora eu tivesse no mínimo três vezes o comprimento do maior deles.  Mesmo assim, aprender a forma como andavam, saber que apenas miavam, era uma sacada ótima para mim...
            Era uma bela manhã, aquela bola amarela no céu esquentava bastante, apesar das sombras das árvores.
            Fui contornando o parque. Sempre com cautela. Sempre me escondendo ao menor sinal de perigo.
            Alguns homens enrolavam fios de luzes em algumas árvores ao redor. Estava claro para mim: era o natal. Tinha ouvido certa vez alguns humanos comentando sobre o assunto; falaram também de presentes e “tones”, “panetones”, ou algo do tipo; não sei bem o que é... Peguei carona em um caminhão ― cheio de lixos na traseira ― que seguia pela Avenida Paulista. Fui olhando as placas das ruas, procurando nomes de lojas.
 Uma chuva começou lentamente. Meus pelos ficaram embaraçados, mas permaneceriam deste jeito. Eu não costumava me lamber, tinha bons motivos para não fazer isso; motivos que não quero revelar agora. Não me sinto confortável.
Foi na Avenida Paulista mesmo que desci. Minha agilidade felina foi útil naquele momento, pois havia uma quantidade significativa de humanos.
            Entrei sorrateiro numa livraria, mas não pela porta da frente — dei um jeito de escalar para entrar por cima. E sim, por sorte havia uma janela semi-aberta. Assim que botei as patas naquele carpete marrom, senti um gás estomacal vindo à tona. Eu não estava tão bem, mas logo aquilo passaria. Comecei a procurar livros que poderiam me ajudar em minha jornada. E foi quando estava lendo sobre as catedrais antigas que uma porta se abriu e se fechou rapidamente. Avistei um ser humano, um homem, mas deveria ser jovem. Ok, não tive escolha, larguei o livro onde estava e saí rapidamente dali. Se tive tempo de pegar as informações que precisava? A resposta é: não exatamente.
            ‘Não poderia ter sido visto. Tenho que fazer algo a respeito!’
            ― Acho que terei que matá-lo!